Cavaleiros de uma távola quadrada?
Tem filme nesse jogo?
Bem-vindo a Londres. No auge da revolução industrial, onde a tecnologia se mostra ao mesmo tempo anacrônica e contemporânea, engenheiros utilizam a eletricidade de forma interessante. Zepelins voam nos céus, a comunicação é feita sem fios, armas disparam filetes de energia, entre outras coisas. Mas nem tudo são flores. Uma insurgência está acontecendo nos becos da cidade, rebeldes anti-governo planejam a sua destruição e queda. E algo maior espreita a todos.
A ordem de cavaleiros, fundada por Rei Arthur há muitos séculos antes, vêm lutando contra humanos mestiços, que assumem partes animais, especificamente lobos. Quase perdendo essa guerra, o ponto de ruptura foi a descoberta de um líquido negro (talvez um paralelo com o Santo Graal) que propiciou literalmente vida nova aos cavaleiros, curando ferimentos e prolongando a sua existência. Hoje (em 1886, é claro), a ordem continua existindo como poder paralelo de segurança do reino. Seus membros são proxies dos cavaleiros originais, mantendo as suas alcunhas.
Infelizmente os personagens principais são muito pouco desenvolvidos, sendo apenas arquétipos que já conhecemos: o velho sábio, o jovem rebelde, a moça par romântico e o herói com a sua jornada (queda e ascensão). Mais para perto do final, vemos algum desenvolvimento, mas já é tarde demais. O desenrolar da trama é muito lento, e muito banal inclusive. Talvez essa esquizofrenia entre jogo e filme atrapalhe demais o andamento, por não saber qual mídia que se está trabalhando, os desenvolvedores não acertaram a mão. Além que o jogo termina numa crescente e sem uma conclusão decente. Ou seja, soa mais como uma decisão caça-níquel para garantir uma continuação do que uma decisão criativa de verdade.
Entretanto, a apresentação de mundo do jogo é irrepreensível. Muito bonito, detalhado e até mesmo cinzento na medida certa. O jogo vem numa proporção cinemática, trazendo faixas pretas acima e abaixo da tela além de um filtro apropriado. Por vezes, a imagem fica um tanto escura prejudicando a visibilidade, mas nada que atrapalhe.
Tem jogo nesse filme?
The Order possui uma interface bastante minimalista (afinal é um filme). O jogo possui dois tipos de momento (quando o jogador está no controle). O primeiro momento é a navegação em formato de exploração. Ou melhor nem se trata de exploração, mas sim de andar apenas para frente. Mas como o boneco não corre, para que você não perca nenhum detalhe, ele anda mais lento que uma lesma.
Para que o player não fique entediado, existem jornais e outros itens que você pode interagir. No entanto, o máximo que você pode fazer é ficar girando a mão e ver o item em diversos ângulos, apenas alguns suscitam comentários por parte de Galahad. E o pior, não existe um arquivo desses itens, ou seja, eles não são possíveis de serem acessados depois, nem saber se você pegou todos naquela área. E tem mais, existem gravações que você pode colecionar, da mesma maneira que o Bioshock, só que sem o mesmo brilhantismo. As gravações são genéricas e totalmente desnecessárias, não fazem muito sentido com o mundo apresentado. Para deixar também as coisas ainda mais agitadas, há dois mini-games: o de abrir fechaduras e o de destruir contatos elétricos.
O segundo momento é quando o personagem já se move com mais velocidade, essa é a dica de que vai começar o tiroteio. O display de armas já aparece no canto inferior direito da tela. O combate é competente e bastante tradicional, remetendo ao Gears of War. O acervo de armas é interessante, mas nada que impressione, no final são as mesmas armas de sempre. Mas com o agravante de que você não sente o peso dos tiros. Os efeitos sonoros nessa área não são muito bons. As granadas também estão inclusas. O sistema de cobertura é sem muito mistério e funciona como deve. Nada nesse quesito de combate compromete ou impressiona. É simplesmente regular.
O jogo, contudo, abusa dos famigerados QTE’s (quick-time events). Existe uma certa arbitrariedade na escolha dos momentos onde têm os QTE’s, não existe um conceito ou regularidade por trás. Aliás, muitos momentos de QTEs não são nem rápidos de fato, a tela chega a pausar e você pode calmamente apertar o botão. Posso apontar uma utilização interessante de QTE’s em duas lutas no jogo, no entanto, particularmente, creio que essas são lutas que com certeza não deveriam ter esse tipo de sistema para sua resolução. Poderiam ter sido escolhidos outros momentos para essa utilização e também mais instâncias, porque esses dois são os únicos.
Nem filme nem jogo…
Como filme, ele falha, primeiro, porque obviamente esta não é mídia adequada, logo de partida. Segundo, os desenvolvedores precisam entender que para contar uma história em uma mídia interativa ela não deve imitar o cinema (viu David Cage!). Temos tantos exemplos de jogos que contam histórias interessantes e de formas diferentes que não é possível que a galera da Ready at Dawn não entenda.
Como jogo, ele não falha. Porém, não encanta. Alguns vão argumentar que além de tudo é um jogo curto e que não vale o dinheiro despendido, outros vão argumentar de forma diferente (jabá gratuito). A duração não me incomodou, mas o que incomoda mais, é que nesses poucos momentos que passamos nesse universo, quase nada acontece, fica apenas a promessa para um próximo.
Bom, dito tudo isto, apesar dos pesares, não vou dizer que não me diverti ao longo dessa jornada, e a minha nota reflete isso. Creio que é o tipo de jogo que em outras épocas teria nos impressionado muito mais, imagine-o como competidor do Gears of War original? Hoje, felizmente ou infelizmente, esperamos muito mais dos nossos jogos. Quem sabe numa próxima oportunidade?