Fallout 4 – Primeiras Impressões

A guerra nunca muda, mas Fallout sim

Assim como muitos que estão aqui agora, eu também estou sendo consumido por Fallout 4. Depois de umas 15 horas de jogo e uns 20 quests completos, trago minhas impressões iniciais a respeito desta saga pós-apocalíptica. Tenho muitas opiniões e conjecturas a respeito dele e, principalmente, da sua narrativa. Serei o mais cauteloso possível quanto a spoilers, mas, se você é daqueles que não pode saber absolutamente NADA de antemão, deixe isso pra lá e leia mesmo assim.

Antes disso, vamos falar da mecânica. Nos primeiros quinze minutos de jogo fiquei um pouco perdido, pois estava bastante acostumado com Fallout 3 e New Vegas. No final da primeira hora eu já estava idolatrando os funcionários da Bethesda. Ao longo da minha carreira de programador, sempre pude perceber que as soluções mais bonitas são as mais simples. Assim me senti jogando Fallout. Diversos elementos antigos foram redesenhados, simplificados e melhorados.

O exemplo disso que mais me chamou atenção foi a Radiação. Quem jogou os anteriores lembra que, quando exposto a ambientes ou a comidas irradiadas, o personagem é contaminado com radiação, medida em pontos, Rads. Tanto no 3 quanto em New Vegas, os Rads eram contabilizados em uma barra própria. Demorava muito ate que a contaminação prejudicasse de fato o jogador. Ela, que deveria ser algo bastante relevante num mundo pós-guerra nuclear, era quase irrelevante. Já no 4, os Rads são descontados do HP máximo do personagem. Isso faz com que o jogador tenha que estar sempre atento. Tudo muito simples e elegante.

fallout4 1Rads restringindo o HP

Outro exemplo de melhora foi na mecânica de Level Up e habilidades. Ao contrário dos jogos anteriores, Skills e Perks viraram uma coisa só. Tudo é chamado agora de Perk. Cada um deles tem a ver com uma das seis características primarias do personagem, o bom e velho S.P.E.C.I.A.L. Tirando Lockpicking e Hacking, não é preciso mais escolher quais habilidades específicas que se quer evoluir. Quando antes um jogador era obrigado a escolher alocar seus pontos ou em Barter (habilidade de barganha) ou em Speech (“lábia”), agora ele simplesmente evolui o Carismacomo um todo. O resultado disso é uma diferença sensível a toda mudança de nível.

fallout_4_perk_poster_cropDetalhe dos perks, cada um organizado embaixo da característica a que se relaciona

Os NPCs que você pode ter como companhia também foram repensados. Antes eu estava acostumado a gritar “SAI DA FRENTE!!!!” para eles umas 30 vezes por hora. Fico feliz em dizer que esse número caiu pra 10. Minha pressão sanguínea e meus vizinhos agradecem. E, seguindo a onda do desapego que deve ter acometido a Bethesda, os personagens não tentam mais andar atrás de você custe o que custar. Se seu companheiro estiver tendo dificuldades em te seguir, pode ter certeza que ele vai brotar meio que magicamente perto de você. Mas fique tranquilo, ele fara isso de forma elegante, sem você ver. Na velha batalha entre realismo e fluidez, fico feliz tenham escolhido fluidez.

Como não poderia deixar de ser, a trilha sonora também é excelente. Não digo só do rádio que o jogador pode ouvir para romper a solidão do deserto nuclear, como também do som ambiente. Trilhas muito bem compostas que dão bem o tom para os momentos de tensão, tanto narrativos quanto porradativos.

Nem tudo são flores, talvez…

E os defeitos? Pois é, correndo o risco de receber um carimbo de fanboy gigante na testa, digo que ainda não me decidi se os defeitos são de fato defeitos. Explico: o que mais senti falta nesse jogo foi a vasta gama de escolhas morais que cada quest apresentava. Os quests são mais lineares e as opções de moral duvidosa são geralmente objetivos opcionais. Suas escolhas não impactam tanto no desdobramento da historia quanto no New Vegas, por exemplo. Em compensação, a coesão dos quests com a narrativa principal é muito maior que nos jogos anteriores. Até agora, quase toda missão teve algum desdobramento no objetivo principal, e todas as facções são relevantes. Fiquei muito animado de perceber que são poucas as side quests puramente side, quase tudo importa. A narrativa é muito mais amarrada e interessante assim. Quanto mais liberdade narrativa é dada ao jogador, menos é disponível ao roteirista. Sendo assim, não estou tão pesaroso quanto imaginei que ficaria. Um excelente efeito colateral dessa maior amarração é a participação dos companions na construção da narrativa. Quem você escolhe como companhia para cada momento faz diferença.

Outro “defeito” que me deixou incerto de início foi a mecânica de diálogo. Há menos opções de resposta que os anteriores. Mas, novamente, aos poucos isso foi me conquistando. Nos anteriores era possível quase sempre voltar atrás e escolher novas opções. Mas como a flecha lançada e a oportunidade perdida, a palavra falada também não volta atrás. Isso gera uma maior tensão e menos controle sobre o resultado de cada interação, o que enriquece bastante a experiência. E é claro que você pode salvar antes de um diálogo e dar load se algo der errado, isso só nos impede de sermos amigos, mas somos todos livres.

Blade Runner e direitos civis, ou porque nada é clichê a toa.

Vamos a parte que me interessa de fato nesse, e em 90% dos jogos que eu gosto: a narrativa em si.

Assumo que quem chegou até aqui já viu, pelo menos, o trailer do jogo. Todos sabemos que o jogo começa durante a guerra fictícia entre China e EUA em 2077, que transforma os Estados Unidos no rico, e paupérrimo, universo da franquia. O/a protagonista está em casa, com seu bebe e seu marido/mulher. Bombas atômicas caem, o sonho acaba, todos correm pro bunker. Depois de 200 anos congelado, e de outras coisas, o protagonista acorda em um mundo insólito e muito diferente do seu. Assim começa sua missão para recuperar algo que lhe é muito precioso e que está nas mãos de gente que é tão poderosa quanto misteriosa. E assim acaba o que eu tenho para falar do protagonista. O que interessa mesmo nesse jogo, como em quase toda obra boa de ficção científica, são o universo retratado e as críticas feitas à sociedade atual.

O pano de fundo da narrativa desse jogo são os Synths, androides construidos por um instituto para servirem a um propósito, ora varrer, ora matar. Muitos deles, no entanto, possuem um “cérebro” tão avançado que têm sentimentos e desejos humanos. O mais humano deles, claro, é fugir da escravidão. O jogo aborda diversas facetas desses humanos heterodoxos. Desde uma questão simples da sua aceitação social por parte de uma sociedade que os generaliza, os teme e os odeia, até questões mais psicológicas e internas. Em duas ocasiões, me vi em diálogos com synths que não só defendiam seu lugar como humanos, mas também como mulheres. Impossível não fazer uma ponte com o debate de gêneros e direitos civis tão em voga hoje em dia.

fallout4 3Entretanto, nem todos parecem humanos…

Tudo isso é abordado com o humor que eu já estava acostumado das outras séries, personagens memoráveis e a hiperviolência caricata e genial da franquia.

Menções Honrosas

Dou um destaque especial a mais uma diferença entre este e os seus jogos precursores. Provavelmente por se tratar de um protagonista que é contemporâneo à guerra, muito da narrativa secundária do jogo é a respeito desta época. Nada incomum é hackear um computador e descobrir um diário de alguém com entradas de dias antes da catástrofe nuclear. Seja da produção de um filme, inadvertidamente reclamando de uma atriz que todos querem demitir ou de uma base militar onde já se antecipava de certa forma o que estava por vir.

Não posso terminar de escrever sem mencionar o colecionador de artigos de baseball e “especialista” no assunto. Ao chegar em Diamond City, encontre-o e faça a quest que ele abre. Demora dez minutos e vale muito a pena.

falloutbaseball
Saca tudo de baseball

Essas são minhas impressões iniciais. Não vou dar uma nota agora, pois ainda tem muito jogo pela frente e hoje em dia sou maduro e cínico, já tive meu coração partido muitas vezes.

Vá jogar Fallout!

Resenha: Broken Age

Broken Age“Like a Bucket of fingers”
“Like an alligator wrestling a pretzel”
“Like a mathematical formula”
“Like a lazy pole vaulter”


“Essa galera que fez The Cave não tem nenhum jogo novo, não?” Esta pergunta foi repetida algumas vezes em momentos de tédio eletrônico por minha ilustre namorada, a quem eu apresentei o videogame há seis anos atrás. Todas as vezes que esta dúvida surgia, procurávamos tanto no site da Double Fine quanto na PS Store. O trailer do Broken Age nos chamou atenção algumas vezes, mas, até pouco tempo, nenhum de nós tinha PS4. Recentemente este problema foi sanado do meu lado, e comprei o Broken Age.

Pra ver se valia a pena, comecei a jogar antes dela. Pouca coisa, só até zerar. Calma, não pense em mim como um viciado egoísta, houve uma boa razão: aguentar o jogo todo não é um trabalho para quem só joga há seis anos. É preciso maturidade e paciência para vencer certas partes desta saga. Vella e Shay precisavam da minha ajuda para vencer suas tribulações. Por muito pouco não os deixei na mão…

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“Por pouco não deixei os dois dormindo”

O jogo, ao mais famoso estilo Tim Schafer, é point and click. Logo no início notei algo muito promissor: o cursor alterna entre todos os objetos interativos do cenário quando se move o analógico direito. Fiquei feliz, pois de cara soube que não haveria aquele momento em que ficaria empacado varrendo cada pixel da tela para descobrir o que fazer, ao mais famoso estilo Tim Schafer. Os puzzles seriam um desafio mental, de pura lógica e método, causa e consequência. Não foi bem assim. Divido os puzzzles deste jogo em três grupos: os óbvios, os impossíveis, e o maldito puzzle do nó.

Muitos dos puzzles são tentativa e erro e/ou não fazem muito sentido. No lugar de um epifânico “Ah, então é assim!”, eu me peguei na maioria das vezes em um “Sério mesmo?”.

tube“Hmmmm, qual dessas seis possibilidades faz alguma coisa que eu não imagino? Vamos tentar todas…”

Em uma ocasião, é necessário esperar alguns minutos sem fazer nada para se obter um item. O puzzle final do jogo também não faz nenhum sentido, basicamente a solução é agir de forma burra. E o puzzle do nó… Ah, que fúria. Uma cólera digna de épicos gregos. Nele o jogador tem que, como já deve ter ficado implícito, desatar um nó cego. Sem muitos spoilers, é necessário achar um especialista em nós, DESCREVER o nó para ele e voltar com instruções passo a passo. A cada erro o nó muda, e é necessário repetir o processo. Ah, e não raramente ocorre um bug em que a opção certa não está disponível.

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“Nenhuma dessas, pra mim parece um game designer que não foi amado pela mãe”

Então caro leitor, você deve estar se perguntando por que eu, uma pessoa que não foi paga para escrever esta resenha, jogou Broken Age até o final? Muito simples: o roteiro do jogo é um dos melhores que eu vejo há um tempo. O tema central gira em torno de tradição e religião, e o porque de termos a tendência de não questionar a primeira e buscar a segunda. O jogo acompanha a vida de Vella e Shay, dois jovens com seus problemas. Vella está se preparando para ser oferecida como sacrifício a um monstro que visita sua vila a cada 14 anos. Perguntando a seus familiares por que não lutar contra ele, ela sempre ouve “Porque sempre fizemos as coisas assim”. Frase emblemática e verossímil, reforçada ao longo do jogo em várias situações. Já Shay vive em uma nave espacial sob os cuidados de uma mãe-computador superprotetora. Sua missão e destino são um mistério que seu tédio e sua curiosidade adolescente se põem a resolver.

hipster“Curtis já usava camisa xadrez muito antes de virar moda.”

Estes temas, embora sérios e relevantes, são abordados com um humor leve e que muitas vezes me fez rir alto sozinho em casa. O jogo tem personagens memoráveis e surpreendentemente complexos, com qualidades e defeitos. Desde o Guru com algo a esconder até seu súdito que leva a seita muito a sério, passando pelo lenhador com medo de árvores. Um destaque especial para as duas sacerdotisas cegas, cujo arco de narrativa é simplesmente perfeito.

Riddle“Repare na consternação de Vella ao perceber que estava frente a frente com personagens muito mais interessantes que ela.”

O jogo é dividido em dois atos, e me capturou de verdade no final do primeiro. Estava tão de saco cheio de seus puzzles que apelei para um walkthrough só para adiantar a história e chegar logo no final. Se você é como eu e valoriza uma boa história em um jogo, medite, tome um chá de camomila e encare Broken Age. Se paciência, ou masoquismo não são seu forte, pelo menos veja um walkthrough.

Nota: notaBA (2,5 / 5,0)

Resenha: Dark Souls 2 – Scholar of the First Sin

Dark Souls 2: SOTFS

Perhaps you’ve seen it, maybe in a dream. A murky, forgotten land. A place where souls may mend your ailing mind. You will lose everything, once branded. The symbol of the curse. An augur of darkness. Your past, your future, your very light. None will have meaning and you won’t even care. By then you’ll be something other than human. A thing that feeds on souls. A hollow.


O CONTO DAS ALMAS SOMBRIAS

A espada de Vendrick assobiava furiosamente enquanto cortava o ar. Eu sabia que qualquer erro seria fatal e significaria a morte. Procurava uma pequena brecha – não para atacá-lo, mas para que conseguisse dar um gole no meu Estus Flask, o que me garantiria mais algum tempo de vida. O suor escorria pelo meu rosto e meus braços fraquejavam, cansados de empunhar a espada por tanto tempo. Entretanto, parar não era uma opção. Quantas vezes já havia estado ali naquele mesmo aposento escuro, e quantas vezes minha alma já havia sido ceifada pelo Rei de Drangleic? Estava consciente que a batalha contra ele nada mais era do que um reflexo de mais uma disputa interna que ocorria entre minha paciência e minha soberba, assim como tantas outras que já haviam transcorrido ao longo da minha jornada.

Lançado pela From Software em 2014, Dark Souls 2 trouxe de volta ao mundo gamer a aflição, o desespero e a glória já cimentadas anteriormente como pedra fundamental pelos seus predecessores: Demon Souls e Dark Souls. Como se não fosse o bastante, em 2015 fomos agraciados com uma outra pérola: Dark Souls 2 – Scholar of the First Sin, que não só compila o hit de 2014 com todos os DLC’s lançados para ele, como também traz mudanças em todas as fases, incluindo novos inimigos, novos NPC’s e um novo final.

Dito isto, resta apenas uma pergunta: se você tem um PS4, Xbox One, PC, PS3 ou Xbox 360, vale a pena desbravar o mundo de Drangleic?

scholar 0“Enfrentar ao mesmo tempo o Nemesis medieval e um hipopótamo gigante de um olho só? Tô dentro.”

O CONTO DO REI QUE ABANDONOU SEU TRONO

A história, assim como acontece nos outros jogos da série, não é contada de uma maneira trivial. Para entender o que ocorre a sua volta você deverá prestar bastante atenção nas conversas com os personagens e nas descrições dos itens do jogo. O game transcende a narrativa linear dos jogos comuns e propõe ao player de uma forma nada explícita reunir pequenas pistas que vão sendo apresentadas desde seu início com o desígnio de reconstruir a história perdida do reino de Drangleic.

Aos poucos, uma jornada que começa com o objetivo de curar a maldição que assola o seu personagem toma proporções muito maiores. Mergulhando no jogo você vai conhecer a história dos irmãos Vendrick e Aldia, vai entrar a fundo nas motivações da Rainha Nashandra, vai reviver as memórias da guerra com os Gigantes e perceber que cada cenário do jogo tem um propósito específico e uma razão de existir.

scholar 2“E aviso desde já: o jogo se passa em um mundo onde Papai Noel é Rei”

O CONTO DO HOMEM QUE NÃO SABIA MORRER

Quanto ao gameplay, a fama da série Souls a precede. Um gamer como a gente – experiente ou novato – já sabe o que esperar. As batalhas são difíceis, porém são justas. O jogo é desafiante, a curva de aprendizado é longa e tortuosa, os inimigos são numerosos e suas frustrações serão muito maiores do que ser informado de que sua princesa infelizmente está em outro castelo.

Vale salientar que se você é um recém-chegado na série, eu diria que Dark Souls 2 – Scholar of the First Sin é uma ótima porta de entrada. O jogo é consideravelmente mais fácil que os anteriores. Obviamente, fica a observação: ser mais fácil não significa dizer que o jogo é tranquilo como uma caminhada no parque.

Fique também despreocupado porque a escolha da sua classe de personagem no início do jogo decerto não traçará o futuro de como ele vai se desenvolver. Esteja você construindo um guerreiro brutamontes ou um mago poderoso, são incontáveis as formas de se aproximar de cada duelo e de como evoluir seu personagem. E, no final das contas, caso você morra – e confie em mim, você vai morrer – saberá que a culpa foi única e inteiramente sua. Mas não se preocupe! Como uma fênix, você renascerá em uma bonfire e tentará uma vez mais mudar o seu destino.

scholar 3“Entretanto, todos nós sabemos que seu verdadeiro destino será ler diversas vezes a frase mais conhecida de todos os jogadores da série Souls”

O CONTO CANTADO PELOS AMIGOS

O multiplayer também está espetacular e funciona da mesma maneira que nos jogos anteriores. Seja ajudando um companheiro a acabar com um chefe ou invadindo de surpresa algum player desavisado, a diversão será intensa. E não confie inteiramente nas mensagens deixadas pelos outros jogadores!

Mas o melhor ponto do jogo – e de toda a série Souls, na minha modesta opinião – é a resenha com os amigos. Nada melhor do que discutir como passar de uma fase complicada, explicar onde está aquele NPC escondido ou dar aquela dica especial de como matar aquele chefe impossível. Conversar sobre o jogo é quase uma maneira de jogá-lo uma vez mais. As batalhas se tornam eternas nas vozes dos bardos.

No final das contas, mesmo sendo mais acessível em termos de dificuldade, Dark Souls 2 – Scholar of the First Sin não foge das suas raízes. Os designs dos chefes estão cada vez melhores e as batalhas ficarão sempre em sua mente. E até mesmo inimigos normais, como o guerreiro tartaruga de Forest of Giants, os soldados de Iron Keep, ou as feiticeiras de Shrine of Amana serão capazes de deixar até o mais poderoso dos guerreiros com o cabelo em pé.

E uma coisa é certa: vencendo ou perdendo, suas mãos estarão suadas e tremendo no final.

Praise the sun!

Nota: scholar nota (5,0 / 5,0)

Resenha: Soul Gambler

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Aposte a sua alma e controle a realidade


O MITO DE FAUSTO

Escrito e publicado em 1808 por Johann Wolfgang Goethe, o poema “Fausto, uma tragédia” é considerado umas das muitas obras primas da literatura alemã. Os mais de doze mil versos contam a história de Fausto, um homem que fez um pacto com o Demônio para preservar sua juventude.

Lançado em 2014 para PC pela desenvolvedora indie brasileira Gamestorming, o jogo Soul Gambler reconta a história escrita por Goethe de uma maneira inteligente e dinâmica, colocando o gamer na pele de um Fausto reinventado para os dias de hoje. Logo no início do jogo, ao sair do trabalho, o player esbarra com uma velha em um ponto de ônibus e recebe uma proposta no mínimo tentadora: vender parte da alma para ter todos os seus desejos realizados!

Prepare-se para embarcar em uma perturbadora jornada, apostando parte da sua vida para revelar uma nova e obscura realidade à sua volta, mantendo viva uma mitologia que nasceu há mais de 200 anos atrás.

soulgambler1“Beleza, Fausto! Pode parar! Já entendi porque você está disposto a vender tua alma para mudar a realidade…”

AVENTURAS FANTÁSTICAS?

Enquanto jogava Soul Gambler não pude deixar de lembrar das Aventuras Fantásticas, série de livros role-playing que eram uma febre no Brasil nos anos 80 e 90. Escritas por Steve Jackson e Ian Livingstone, as obras primas transformavam você no verdadeiro protagonista da história enquanto lia: a cada parágrafo, uma escolha diferente devia ser feita para avançar a sua aventura.

O gameplay do jogo da Gamestorming é muito semelhante aos livros citados acima, e ao mesmo tempo bem tranquilo e intuitivo. O enredo se desenvolve como uma história em quadrinhos interativa: a cada quadro uma escolha deve ser tomada – e cada escolha impactará em como a jornada de Fausto irá se desenrolar.

Além disso, logo em um dos primeiros quadros, você poderá distribuir pontos entre os atributos do personagem – saúde, manipulação, inteligência e carisma. Esses atributos terão fortes consequências diretas no desenrolar da trama. Dependendo da forma como o seu Fausto for construído, você terá acesso a escolhas únicas e será impactado de formas diferentes pelos fatos relevantes que ocorrem durante o jogo.

soulgambler2“Não contavam com minha astúcia!”

DOU METADE DA MINHA ALMA POR MAIS TEMPO DE JOGO

A história do jogo é bem instigante e faz com que o gamer avance rapidamente pelos quadrinhos para ver o que vai acontecer. E infelizmente é aí que mora o ponto fraco do jogo: ele é muito curto! Em um pouco mais de uma hora você conseguirá percorrer a aventura de Fausto de cabo a rabo. Fica o recado para a Gamestorming: queremos mais!

De qualquer forma, o jogo é tão convidativo que rapidamente você estará iniciando outro playthrough, escolhendo diferentes atributos e tomando outras escolhas para ver os incontáveis caminhos que Fausto pode percorrer.

soulgambler3“E esteja preparado para receber conselhos dignos de Obi Wan Kenobi”

E COMO SE NÃO BASTASSE…

No final das contas, ainda tem outro belo motivo que faz o jogo ser ainda mais convidativo e que compensa o gameplay curto: o preço! Para você que estava se preparando para bancar o Fausto e vender parte da sua alma para poder comprar o jogo, saiba que não vai precisar chegar a tanto. Na loja Splitplay o jogo está à venda por míseros R$ 6,29! E para aqueles que forem mais rápidos, atualmente também está rolando um super desconto de 50% – então o jogo acaba saindo por R$ 3,14. Um preço quase inacreditável para os dias de hoje.

Com cenários muito bem desenhados, roteiro cativante completamente em português e gameplay de fácil acesso até mesmo para aqueles que não estão acostumados com videogame, Soul Gambler mostra que você não precisa ter um orçamento de blockbuster para poder brilhar no cenário gamer. As incontáveis escolhas de Fausto e os diversos finais de sua aventura vão ficar em sua mente por algum tempo, mesmo enquanto você não estiver jogando.

Afinal, quem nunca pensou em alterar a realidade ao seu bel prazer?

Nota:  soulgamblernota  (4,0 / 5,0)

Resenha: Rogue Legacy

rogue1Construa seu Legado!


UM HERÓI E SUA LINHAGEM

Criado por Lee Falk em 1936, O Fantasma, também conhecido como “Espírito que Anda” ou “O homem que não morre”, sempre foi meu herói de quadrinhos favorito. O que eu achava mais legal do personagem era que ele não tinha superpoderes, nem tampouco era imortal como seu codinome dizia. Na verdade se tratava de uma dinastia de homens que lutava contra o crime: sempre que um Fantasma morria, seu filho sucedia seu posto.

Ao jogar Rogue Legacy, jogo indie roguelike lançado pela Cellar Door Games em 2013 para PC (com versões para PS3, PS4 e PS Vita em 2014), foi impossível não notar a semelhança com o Fantasma. No jogo, você controla um cavaleiro que tem como missão desbravar uma dungeon. Porém, ao morrer, ao invés de receber uma tela de Game Over, você tem a possibilidade de selecionar o herdeiro daquele herói que morreu para continuar sua missão.

rogue2“Você acha que sua missão será fácil só porque carrega uma espada do seu tamanho?”

 GAMEPLAY

Em teoria, a jornada do player em Rogue Legacy é bem simples. Entrar em uma dungeon 2D, derrotar quatro chefes – cada um deles posicionado em uma área distinta (Castelo, Floresta, Torre e Calabouço) – para então ter o direito de enfrentar o último chefe.

Para isso o herói controlado pelo jogador irá contar com as habilidades básicas de pulo e ataque com espada, bem como a possibilidade de usar mágicas que gastam MP (mana points). Durante sua aventura ele também achará incontáveis moedas de ouro que ele usará para dar upgrade nas habilidades do seu personagem, bem como desbloquear novas classes para utilizar.

Simples, não? Bem… nem tanto.

rogue3“Medo do escuro? Um guerreiro como você?”

 A(s) CEREJA(s) DO BOLO

A primeira surpresa que o player irá notar é que, cada vez que você entra na dungeon, ela é randomicamente gerada. Isso faz com que cada investida para completar a missão se torne uma aventura única.

Além disso, conforme já mencionado, ao morrer, será necessário escolher um novo personagem para continuar. O jogo sempre te dará 3 opções de herdeiros para escolher. Este novo personagem terá diferentes habilidades e características daquele primeiro herói, fazendo com que o player tenha também que adaptar seu estilo de jogo ao novo personagem escolhido.

Como se não bastasse, cada herdeiro randomicamente gerado também carrega consigo traços (traits, no original) característicos. Portanto, prepare-se para jogar com um personagem hiperativo e com espasmos musculares! Ou talvez com um herói daltônico e que morre de medo de galinhas! Ou quem sabe um guerreiro hipocondríaco e que sofre de síndrome do intestino irritado?

Tudo isso irá impactar na sua jornada, muitas vezes complicando ou facilitando cada gameplay.

rogue4“Aquele momento em que você se dá conta que sua estratégia deu errado…”

 VEREDITO. VALE A PENA?

Claro que vale. Mas não vá esperando um jogo fácil. Prepare-se para morrer (e muito!) e construir uma enorme linhagem de heróis tentando completar a sua missão, de paladino até hokage! Os chefes são desafiadores e exigem estratégia por parte do player (button mashers, esse jogo não é para vocês!)

Vale salientar também que se você é um jogador mais hardcore que gosta de um belo desafio, é possível desbloquear uma versão remix de todos os chefes onde a dificuldade fica ainda mais acentuada. Recomendo!

Com humor singular, belíssima arte pixelada que cria um ambiente nostálgico para os amantes de 8 bits, Rogue Legacy é o tipo de jogo que, depois que você começa a jogar, fica difícil de parar.

Nota: roguenota (4,0 / 5,0)