Resenha: Okami

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Muitas vezes parti determinado em busca de um jogo por um motivo específico – “quero um jogo de luta!” ou “quero um jogo de ação!” e até mesmo “quero um RPG!”. Mas quando fui buscar Okami eu desejei algo que nunca havia desejado antes.

“Eu quero uma obra de arte!”

Lançado no ano de 2006, Okami chamou-me a atenção por ter gráficos cel-shading acima da média. Era como olhar para uma aquarela em movimento enquanto destroçava inimigos com uma jogabilidade tão sólida quanto “Legend of Zelda: Wind Waker”. Além disso, a história, baseada nas lendas do Japão feudal, prendia bastante a atenção. Vamos a ela.

Eu sou… um lobo?

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Baseado nas lendas japonesas, temos como protagonista uma loba branca (ou será lobo?) chamada Amaterasu, que é a divindade do sol segundo o Xintoísmo, o que explica parte dos poderes da nossa protagonista.

Na história do jogo, pode-se ver em flashback cem anos antes dos acontecimentos do game (e o flashback tem quase cem anos de duração também), nele é explicado que um guerreiro chamado Nagi uniu forças com um lobo chamado Shiranui para salvar a jovem donzela Nami das garras do terrível demônio de oito cabeças, Oroshi. Porém eles não tiveram força para mata-lo e apenas o selaram. Cem anos depois, o selo foi rompido e o mal voltou a rondar a vila Kamiki.

Sakuya, guardiã da vila Kamiki, decide convocar mais uma vez Shiranui para limpar a terra de sua maldição e restaure a sua beleza. Surge então novamente a reencarnação de Shiranui, a deusa do sol, Amaterasu.

Esse é o pano de fundo para a grande jornada começar, Amaterasu conhece logo de cara a pulga/andarilho/artista Issun, que acompanha a protagonista para aprender as 13 técnicas do celestial brush e é o alívio cômico da trama. Conhece também o tocador de flauta Waka, que o enfrenta várias vezes no jogo e guarda um grande segredo, além de outros personagens carismáticos como o descendente de Nagi, Susano (Guerreiro e bebum nas horas vagas) e outros mais.

Vou te passar o pincel

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O sistema de batalha de Okami é bem interessante e eficiente, quando surge um inimigo o personagem fica preso em uma espécie de arena amaldiçoada que só se desfaz quando o último inimigo é derrotado. Para isso você pode utilizar três categorias de armas: Escudos refletores, rosários e espadas. Isso remete as três relíquias sagradas do Japão que são a espada Kusanagi, o espelho Yata no Kagami e a Jóia sagrada Yasakani no magatam. Estas jóias, segundo o mito, foram doadas ao Japão pela própria Amaterasu.

Em batalha, os artefatos podem ser classificados como primários e secundários. Na forma primária eles servem para atacar, na secundária servem para defesa. Isso gera uma boa dose de estratégia durante as lutas, bem parecido com a série Zelda. Mas a cereja do bolo e o grande diferencial de Okami é o Celestial Brush.

É possível utilizar 13 técnicas de desenho com o Celestial Brush, que são adquiridos ao encontras as 13 divindades espalhadas pelo jogo, a jogabilidade é muito fluida na versão PS2, abria-se a tela de pintura pressionando quadrado e se fazia o movimento do desenho com o analógico direito criando efeito em batalha, um risco sobre um inimigo, por exemplo, era um poderoso ataque de espada. Seria muito interessante utilizar essa técnica nos controles atuais como a tela de toque do PSVita ou controle do PS4.

Além disso, o pincel poderia ser utilizado para resolver puzzles como desenhar uma ponte caída, criar um vento forte… Realmente era muito divertido desenhar os sinais para avançar no game.

Video game = arte

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Porém, nada chamava mais a atenção que os refinados gráficos cel-shading. Uma beleza sem tamanho para a época, os gráficos tinham o aspecto de pinturas japonesas, uma aquarela de cores raramente vista na era 128 bits. A direção de arte do jogo era tão impressionante que abriu a discussão sobre o patamar dos games. Poderia ser considerada arte um game da qualidade de Okami? Eu diria que sim, o cuidado com a qualidade gráfica é tão evidente que o esforço da Clover Studio é notório. Poucos jogos se igualam nesse sentido.

Para complementar o visual, a trilha sonora do jogo te leva direto para o Japão antigo. O cuidado excepcional com as faixas faz com que o jogador fique totalmente imerso no mundo do jogo.

Infelizmente, talvez pela proximidade do fim da era 128 bits, tanto Okami quanto o jogo feito posteriormente pela Clover Studios intitulado God Hand foram mal nas vendas, o que levou a Capcom a dissolver o estúdio em 2006, porém as mentes criativas de Okami hoje fazem parte da Platinum Games, estúdio criador de Bayonetta e que agora está no projeto New Nier da Square-Enix, como vimos na E3 e podemos acompanhar nos podcasts especiais do Gamer Como a Gente sobre a maior feira de games do planeta (clique aqui).

Nota: OkamiNota (5,0 / 5,0)

Artigo: O sonho de se expressar

Amigos Gamers! Muito se discute sobre os videogames serem uma forma de arte. Alguns argumentam se tratar de um mero passatempo, outros já dizem que é um meio de expressão pessoal. Ao longo dos tempos, o ser humano vem tentando se expressar através de diversas formas: pinturas, esculturas, atuando, escrevendo, cantando, pichando e por aí vai. Mas o que é arte? Por que nos preocupamos com isso? Não vou me meter em tentar definir até porque não sou a pessoa mais indicada para isso. Mas, para uma mídia que tem o poder de mover o coração das pessoas, criar laços e levar a imaginação para outros mundos, é inegável o poder que ela tem.

 A sétima arte

CinemaGame“Sonic. Em breve nas salas de cinema perto de você. (Ainda bem que não…)”

Um paralelo muito comum de ser fazer é comparar videogames com cinema. Alguns desenvolvedores, inclusive, tentam fazer essa comparação com diferentes graus de (in)sucesso (The Order 1886, por exemplo, ou o David Cage com Heavy Rain e outros). O cinema tanto pode ser um passatempo sem objetivo (filmes do Michael Bay) quanto uma faceta de expressão de um artista (muitos até para listar). A verdade é que esta mídia possui um trabalho muito autoral; quem não reconhece um filme do Tarantino logo de cara? Ou a música de um John Williams que trouxe vida a tantos mundos? Ainda assim, o cinema possui aquela faceta blockbuster, AAA, massificada, pronta para consumo. Onde o trabalho individual quase não é reconhecido, não existe uma sensação de autoria.

Um exemplo que gosto de usar é o M. Night Shyamalan, a marca registrada dele estava em filmes como Sexto Sentido e Corpo Fechado. Mas nem se repara nos insípidos, The Last Airbender e After Earth. Ou seja, a mesma pessoa pode produzir tanto trabalhos autorais quanto trabalhos generalistas.

O cinema é talvez o paralelo mais óbvio e o que mais se aproxima da experiência que um jogo proporciona. Mas, há uma diferença essencial: a interação. Com um filme, você está sujeito a visão que o diretor quer passar. Com um jogo isso também é verdadeiro, mas a sua experiência pode mudar conforme você joga o desenrolar da trama. As lembranças que você tem, as dificuldades que você passou, tudo isso serve para construir uma história na sua própria cabeça que pode ir muito além do que foi pretendido.

Metendo a mão na massa

MarioKEY“Onde os sonhos começam”

Hoje a indústria gamer de produção está basicamente dividida em 2 grandes blocos: indie e grandes produtoras. O curioso é que a indústria fez um grande círculo. Nos primórdios da nossa querida mídia, ela era desenvolvida por bravos soldados querendo colocar a sua visão em um pequeno pedaço eletrônico. Infelizmente na época, a Atari coibia seus artistas e não colocava os seus nomes nos jogos, tudo era pertencente a grande marca. Quem não se lembra do primeiro easter egg da história onde era encontrado o nome do criador do jogo em Adventure?

Adventure_Easteregg“Um quadrado aventureiro.”

Da queda da Atari para a ascensão da Nintendo, as grandes produtoras de conteúdo surgiram e dominaram o mercado. Ainda que nomes como Shigeru Miyamoto de Mario, Yuji Naka de Sonic e até mesmo Yuzo Koshiro (o músico) que conseguiu colocar o seu nome na tela inicial de Streets of Rage eram reconhecidos, cada vez mais os jogos tinham a cara da empresa e não dos seus criadores. Óbvio, outliers sempre existiram e sempre existirão, franquias foram criadas e nomes foram associados ao seu talento criativo (Final Fantasy, por exemplo). Mas quem nunca se pegou comentando que certo jogo tem a cara da Capcom, da Konami, da Square, da SEGA e por aí vai?

O mercado de autoria nunca morreu na verdade, sempre seguiu em paralelo no mundo do PC com a plataforma Steam, por exemplo. Mas eu diria que o grande boom veio com a Xbox Live Arcade. Ótima iniciativa da Microsoft em fazer um mercado digital para jogos de menor porte nos consoles tanto para grandes empresas como para talentos empreendedores. Em 2008, Braid veio com uma experiência super pessoal e intimista, que na opinião de seu autor, Jonathan Blow, nem todos entenderam. Mas não é aí que está a beleza do negócio? A partir deste ponto, voltou-se a cada vez mais falar sobre autores dentro dessa nossa querida mídia. Uma ótima experiência para entender um pouco mais disso é o Indie Game: The Movie (dica, tem no Netflix). O filme acompanha a trajetória de Jonathan Blow e outros autores nas agruras para se fazer um jogo.

Hoje a oferta de jogos assim é enorme, tanto é que foi um dos chamarizes da Sony para atrair os seus consumidores para as plataformas PS4 e PSVita. Com a produção de jogos AAA aumentando cada vez mais o seu orçamento, dificultando a compra de uma exclusividade, os jogos independentes podem ser o diferencial neste briga.

Onde está o Brasil?

PropMK“Ah o mercado brasileiro em sua infância…”

Nós, gamers, acompanhamos todo o desenvolvimento desta indústria. Crescemos juntos com os nossos jogos, mesmo que aos trancos e barrancos. Convivemos com atraso de pensamento, pirataria, preços exorbitantes, enfim. Estamos num ponto de ebulição, a cultura gamer no Brasil precisa se desenvolver. Sempre recebemos tudo de fora, exaltamos nomes lá de fora, não que isso seja um problema, é claro. Mas temos nomes fortes outras mídias de expressão: música, cinema, artes e livros. E por que não nos games? Temos muitas ferramentas que antes não tínhamos acesso, plataformas que podemos usar para escrevermos nossos livros, tocarmos nossas músicas, fazermos nossos filmes e apresentarmos as nossas pinturas.

Fazer um jogo. Se expressar através de um jogo é um sonho real e factível. Já tivemos o primeiro jogo que foi financiado pela Lei Rouanet, Toren, que foi feito pela galera da Swordtales e foi recentemente lançado (em breve resenha também). Ótimo passo para a indústria nacional. Mas isso mostra uma esquizofrenia, por que ainda os jogos de videogame são taxados como jogos de azar? E por assim o ser, como se justifica um incentivo a cultura no financiamento de Toren. Por favor Brasil, decida-se!

Outra ótima iniciativa de fomento do mercado e do sonho de muitos gamers é o:

SPLITPLAYAlém de ser um grande empreendimento concebido e executado exclusivamente por brasileiros, o seu produto final é a distribuição de obras feitas por brasileiros e também pelos nossos vizinhos latino americanos. São dois sonhos se realizando através de muito trabalho: o de se ter uma empresa e o de ser uma empresa colaborando para o fomento do mercado gamer.

É com grande prazer e orgulho que o Gamer Como a Gente anuncia a parceria com o Splitplay, pois acreditamos no trabalho que a empresa está fazendo para modificar o nosso cenário e a nossa cultura. Acreditamos que dali pode sair sim o grande nome brasileiro dos games! Sempre que pudermos, contribuiremos para o seu desenvolvimento, seja através de artigos de opinião, análises de jogos, eventos, o que mais vier.

Quer conhecer mais? Clica aqui e entre no site ou ouça o podcast que fizemos com Rodrigo Coelho, um dos membros fundadores. Não tem como não se inspirar.

Conclusão

É possível criar uma obra de videogame que toque as nossas emoções, que perturbe a nossa mente e que conteste os nossos paradigmas. Tem um sonho amigo gamer? Quer se expressar desta forma? Não se acanhe, você pode transformar seu sonho em seu trabalho.  Conte com nosso apoio.