Resenha: The Legend of Zelda: Breath of the Wild

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Zelda Merda, digo, Zelda Breath of the Wild

2.5/5. Essa é minha nota para Breath of the Wild. Deveria respeitar o formato consagrado dos reviews do GCG, mas, por divergir tanto de tudo que eu leio a respeito desse jogo, achei melhor tirar essa etapa do caminho logo e lhe preparar, caro leitor, para o que está por vir.

Antes de mais nada, digo que tudo que eu queria era concordar com as reviews e ter adorado o jogo. Sou um fanboy confesso de Zelda desde o Ocarina of Time. Minha expectativa era imensa, e agora, uns quinze minutos depois de matar Ganon e salvar Hyrule mais uma vez, ela só é menor que minha decepção. E estava muito aberto às mudanças e a quebra com o antigo formato. Vou fazer uma análise um pouco mais objetiva do que estou acostumado, ponto a ponto, sempre salientando o que eu esperava e o que eu obtive.

Puzzles

Provavelmente com um intuito de retomar a sensação de exploração livre que o primeiro jogo da série evocava em 1986, BotW começa com Link recebendo todos os itens que contemplam a mecânica de puzzle do jogo. Sua progressão não depende da obtenção de itens em uma determinada ordem, o que nos jogos anteriores gerava uma narrativa linear com apenas a sensação de mundo aberto. Você conseguia ver a entrada para o Forest Temple no Ocarina of Time, mas precisava do hookshot para alcançá-lo, por exemplo. Todo dungeon tinha um item específico que, uma vez obtido, resolvia quase todos os seus puzzles.

Quando entendi que o jogo seria assim fiquei muito empolgado. Os quatro itens -runas, como são chamados- logo no inicio do jogo possibilitariam, alem de um mundo verdadeiramente aberto, puzzles que necessitassem de seu uso de forma combinada. As possibilidades eram infinitas…

Bombas, plataformas de gelo, imã e paralisar um objeto no tempo: os quatro elementos de Breath of the Wild.

A maior parte dos puzzles são em shrines espalhados pelo mundo, e eles são muitos. São, também, a única remanescência real com os dungeons e a velha estrutura dos Zeldas anteriores. Salas em que se progride, geralmente, usando as tais runas para resolver um problema. Zerei o jogo tendo feito entre 35 e 40 desses shrines. Não gastei mais de dez minutos para resolver nenhum deles. E esse é um problema claro desse jogo: Ele te dá água na boca com as possibilidades das runas e as explora de forma rasa e insatisfatória.

Exploração e platforming

Entendo que, em termos de game design, mais importante que como o jogador pode explorar um mundo, são as mecânicas que o impedem de progredir. Nos outros Zeldas, o progresso era limitado somente pela ausência de itens. Em BotW, existem basicamente dois fatores que te impedem de chegar em algum lugar: temperaturas extremas e um caminho que necessite gastar stamina. Para o primeiro, poções permitem neutralizar a temperatura de forma temporária e roupas especiais, de forma definitiva. A stamina pode ser aumentada usando os itens que se ganha resolvendo os shrines, que fazem papel da experiência.

Link gastando stamina enquanto corre. E no frio sem o casaquinho, desobedecendo a mãe.

BotW é um jogo que escolheu ter pouca indicação de destino, favorecendo uma exploração muitas vezes movida por curiosidade e sem um objetivo pre-definido. Isto não é um problema em si, Dark Souls também faz isso e é uma de minhas franquias preferidas. A principal diferençá é que Dark Souls te recompensa pela exploração. Já BotW… Depois de escalar milhares de montanhas gerindo muito bem minha stamina e, muitas vezes, precisando de algumas tentativas, cansei de quase nunca encontrar nada. Se o jogo espera que eu explore o vasto mundo que ele me apresenta, ele tem que criar um incentivo decente.

escalandoDurante muitos momentos, esqueci que estava jogando Zelda e pensei que era um climbing simulator

Quanto aos lugares muito frios ou quentes, a pouca indicação de onde conseguir gear decente para exploração, quase sempre, também deixa a desejar. Resumindo, senti que o jogo demanda uma exploração cega e não tem um sistema de recompensas condizente com isso. Mais frequentemente do que gostaria, me senti sem rumo e objetivo.

É também importante dizer, nesta seção, o quão ridícula é a mecânica dos cavalos. A ideia é que você domestique os cavalos, capturando-os e usando-os para se locomover. Quanto mais o jogador os usa, mais fortes os laços e mais obediente é o cavalo. Dito isto, que é belo em teoria, o algoritmo de rota dos cavalos é horrível, o que faz com que o jogador tenha que estar constantemente lutando contra o animal para ir na direção que quer. Acrescente isto ao fato do bicho não poder cruzar vários obstáculos e terrenos, e que, inacreditavelmente, ele não é teleportado junto com Link no fast travel. Resultado: não usei.

cavalo selvagemOlha que bonitos os cavalos selvagens. Vamos deixa-los livres?

Combate

Talvez o aspecto que mais diferencie BotW dos outros Zeldas seja onde o jogo tem mais sucesso. Mas calma, tem problemas sérios aqui também…

O combate foi totalmente repensado. A maioria dos encontros se dá em acampamentos inimigos, e a maneira como o jogador entra nesses lugares já é parte da briga. Seja de forma sorrateira, a la Solid Snake; seja empurrando uma pedra ladeira abaixo matando todo mundo; ou seja no estilo rambo, a briga tende a ser boa.

Por se passar em uma versão pós apocalíptica e, como o nome diz, selvagem de Hyrule, o jogo tem muitos elementos que remetem à escassez e sobrevivência. Por conta disso, tanto as armas quanto os escudos tem uma vida útil bastante curta. Isso provoca uma ótima tensão e uma dualidade entre bater ou correr que se encaixa muito bem à proposta. No início do gameplay, achei bem desafiador as armas quebrando rápido, me forçando a gerenciar muito bem meu inventário e escolher muito bem minhas batalhas.

arma quebrando

Dito isso, gostaria de levar você, meu estimado leitor, de volta a 1998. O ano mágico em que The Legend of Zelda: Ocarina of Time foi lançado. Pense que este maravilhoso jogo, este petardo da indústria, essa joia de carbono, foi o primeiro jogo de terceira pessoa com uma mecânica de lock-on. Sim, antes de OoT, a mira em jogos de terceira pessoa era, de maneira geral, horrível. Essa revolução foi e é devidamente e corretamente copiada desde então. Zelda foi a franquia responsável por isso. E por quê que perdi um parágrafo inteiro falando de um jogo de 16 anos de idade? Porque me parece irônico que BotW, que também é Zelda, tenha um sistema de lock-on dos mais nojentos, horríveis e deploráveis que eu já vi.

Todo o propósito do lock é travar a câmera. Em BotW a câmera fica livre. Ou seja, o jogador é obrigado a dividir seu precioso polegar entre atacar e ajustar-la. Imagino que a razão disso seja o fato de que os inimigos te cercam mais do que em jogos anteriores, podendo de atacar pelas costas. Se for isso, o ataque poderia ser nos gatilhos R e ZR… Fora que acontece do inimigo lockado estar fora da tela. Isso, pra mim, é inadmissível. Nos bosses, é especialmente problemático.

Além disso, achei que o dano resultante de um golpe inimigo muito alto. O jogo te pune absurdamente por errar, e os controles do combate não são precisos e aperfeiçoados o suficiente pra justificar isso. Sob o risco de ser acusado de fanboy, Dark Souls faz melhor nesse quesito. Saliento que só faço esta comparação recorrente porque, ao jogar BotW, fica evidente que Dark Souls foi uma inspiração bastante relevante.

Dungeons” e Bosses

Em Hyrule de BotW existem quatro colossos artificiais, tanques de guerra autônomos em formas de animais contruí dos originalmente para ajudar a destruir Ganon. Mas, como os hylians não tem o habito de ler ficção cientifica e prever o óbvio, eles foram possuídos por espíritos sob o comando do vilão. Cada um desses espíritos é um Boss, e as dungeons são os tais colossos.

A ideia da dungeon, que é marca registrada da série, ser uma máquina é ótima. A resolução dos puzzles parte do jogador operar a máquina, mudando o ambiente e tornando acessíveis elementos novos. Por exemplo: um destes colossos é um elefante. Seus puzzles envolvem mudar a tromba de posição, para que caia água em lugares diferentes.

colosso

Mas, como é de praxe nesse jogo, a ideia é bem melhor que a execução. As dungeons são todas extremamente curtas e, na minha opinião, ridiculamente fáceis. Eu entendo e acho justo querer romper com uma fórmula que poderia estar estagnando a franquia. Respeito muito a experimentação e sinto falta disso na indústria dos jogos. Mas essa mudança foi um erro grave.

E quanto aos bosses? Fáceis e sem personalidade. Como o jogo é aberto, pode-se fazer as dungeons em qualquer ordem. Aliás, pode-se não fazer em ordem nenhuma e ir direto enfrentar Ganon sem nenhuma ajuda. Mas, no meu caso, comecei pelo deserto. Ao derrotar o boss de lá, recebi um powerup de ataque que me fez matar os outros bosses com uma facilidade injusta.

Quando se faz um jogo de mundo totalmente aberto, é muito difícil equilibrar as batalhas, dado que o jogador pode passar por elas com variados níveis de força. Esse não é um problema novo nem definitivamente resolvido, mas parece que os desenvolvedores de BotW nem se preocuparam com esse fato. Senti que estava lutando contra bosses elaborados por pessoas que não sabiam nada do resto do jogo.

Narrativa e quests

Como já mencionei, o jogo optou por apostar em narrativas emergentes em vez da tradicional cutscene de explicação. Acho ótimo, se for bem feito. BotW se passa num mundo muito deserto, consequência de um cataclismo prévio. Por essa razão, não há muitos NPCs fora das vilas, aldeias e fazendas. Sendo assim, é de se esperar que, quando um encontro ocorre, ele seja relevante em termos de história. Isso está longe de ser verdade. Não raramente, encontra-se alguém no meio do nada que só repete duas falas.

O Link de BotW acorda de uma câmera de hibernação sem memória. Grande parte da história é revelada ao visitar lugares específicos que o ajudam a recuperá-la e nos dão algum insight sobre o passado. O grande problema é que a história é a mesma de sempre, embora o método de contar seja novo. Não existe muito estímulo a visitar os lugares marcados para receber mais uma vez a mesma ladainha da donzela em perigo. A experimentação na forma não foi acompanhada de uma experimentação no conteúdo.

Novamente, e peço desculpas pela idolatria, peguemos o exemplo de Dark Souls. A franquia conta uma história de uma maneira muito sutil, quase que inteiramente pela descrição dos itens que se ganha. Isso, além de gerar um valor maior para a exploração geográfica, transmite melhor uma atmosfera meio arqueológica, o que é muito bem-vindo em um jogo que se passa nas ruínas de um mundo passado. Os itens de BotW são completamente genéricos. Achar essa ou aquela espada é irrelevante em termos de história. Muitos shrines e dungeons tem, alem de XP, uma arma ou roupa no final que nunca é nada de especial. Zelda sempre foi um jogo de cavernas e tesouros. Este, infelizmente, fez eu me sentir em um jogo de poucas caverna e poucos tesouros, repetidos à exaustão. Entendo que o fato dos itens de batalha quebrarem acaba obrigando uma abundância que massifica tudo, mas podia ter sido melhor.

arma genericaQue surpresa! Quem diria que existia ainda mais um desses por ai…

E as quests? Nesse ponto, todas as críticas já foram feitas a respeito da não-história e poucas indicações de onde se deve ir, ou onde obter determinado item para progredir. Isso cobre as quests principais.

Quanto as side-quests, bom… De todas as sides que fiz, gostei bastante das que levam a algum shrine secreto. Elas são o maior exemplo de uma exploração com significado que me fez tanta falta em outros elementos do jogo. Dito isso, as outras sides são, muito frequentemente, só fetch-quests pra encher linguiça. Perdi a conta de quantas vezes eu tinha que achar alguém perdido, só pra depois saber que precisava coletar 10 frutas, 20 fadas ou 40 ruppees para finalizar. Quase que invariavelmente, toda side-quest te coloca pra catar itens genéricos. Não me recordo de nenhuma delas avançar a história ou lore do jogo de nenhuma forma.

Voice Acting

BotW tem um dos piores voice actings da história recente dos videogames, ou pelo menos a versão em ingles. É constrangedor…

Sendo assim, finalizo esse review extremamente triste. Triste porque sou totalmente a favor da experimentação e do rompimento de velhos costumes, mas nesse caso, senti falta do que eu conhecia e gostava. Triste porque, como essa minha opinião não reflete o que eu tenho lido, talvez o próximo Zelda já não seja mais pra mim. Triste porque o hype das duas primeiras horas de jogo foi totalmente assassinado pelas ultimas 20.

Assim que zerei BotW não tive nenhuma vontade de coletar tudo e terminar todos as quests, como fiz com todos os Zeldas desde 1998. A primeira coisa que fiz foi dar um new game em Twilight Princess…

Fallout 4 – Primeiras Impressões

A guerra nunca muda, mas Fallout sim

Assim como muitos que estão aqui agora, eu também estou sendo consumido por Fallout 4. Depois de umas 15 horas de jogo e uns 20 quests completos, trago minhas impressões iniciais a respeito desta saga pós-apocalíptica. Tenho muitas opiniões e conjecturas a respeito dele e, principalmente, da sua narrativa. Serei o mais cauteloso possível quanto a spoilers, mas, se você é daqueles que não pode saber absolutamente NADA de antemão, deixe isso pra lá e leia mesmo assim.

Antes disso, vamos falar da mecânica. Nos primeiros quinze minutos de jogo fiquei um pouco perdido, pois estava bastante acostumado com Fallout 3 e New Vegas. No final da primeira hora eu já estava idolatrando os funcionários da Bethesda. Ao longo da minha carreira de programador, sempre pude perceber que as soluções mais bonitas são as mais simples. Assim me senti jogando Fallout. Diversos elementos antigos foram redesenhados, simplificados e melhorados.

O exemplo disso que mais me chamou atenção foi a Radiação. Quem jogou os anteriores lembra que, quando exposto a ambientes ou a comidas irradiadas, o personagem é contaminado com radiação, medida em pontos, Rads. Tanto no 3 quanto em New Vegas, os Rads eram contabilizados em uma barra própria. Demorava muito ate que a contaminação prejudicasse de fato o jogador. Ela, que deveria ser algo bastante relevante num mundo pós-guerra nuclear, era quase irrelevante. Já no 4, os Rads são descontados do HP máximo do personagem. Isso faz com que o jogador tenha que estar sempre atento. Tudo muito simples e elegante.

fallout4 1Rads restringindo o HP

Outro exemplo de melhora foi na mecânica de Level Up e habilidades. Ao contrário dos jogos anteriores, Skills e Perks viraram uma coisa só. Tudo é chamado agora de Perk. Cada um deles tem a ver com uma das seis características primarias do personagem, o bom e velho S.P.E.C.I.A.L. Tirando Lockpicking e Hacking, não é preciso mais escolher quais habilidades específicas que se quer evoluir. Quando antes um jogador era obrigado a escolher alocar seus pontos ou em Barter (habilidade de barganha) ou em Speech (“lábia”), agora ele simplesmente evolui o Carismacomo um todo. O resultado disso é uma diferença sensível a toda mudança de nível.

fallout_4_perk_poster_cropDetalhe dos perks, cada um organizado embaixo da característica a que se relaciona

Os NPCs que você pode ter como companhia também foram repensados. Antes eu estava acostumado a gritar “SAI DA FRENTE!!!!” para eles umas 30 vezes por hora. Fico feliz em dizer que esse número caiu pra 10. Minha pressão sanguínea e meus vizinhos agradecem. E, seguindo a onda do desapego que deve ter acometido a Bethesda, os personagens não tentam mais andar atrás de você custe o que custar. Se seu companheiro estiver tendo dificuldades em te seguir, pode ter certeza que ele vai brotar meio que magicamente perto de você. Mas fique tranquilo, ele fara isso de forma elegante, sem você ver. Na velha batalha entre realismo e fluidez, fico feliz tenham escolhido fluidez.

Como não poderia deixar de ser, a trilha sonora também é excelente. Não digo só do rádio que o jogador pode ouvir para romper a solidão do deserto nuclear, como também do som ambiente. Trilhas muito bem compostas que dão bem o tom para os momentos de tensão, tanto narrativos quanto porradativos.

Nem tudo são flores, talvez…

E os defeitos? Pois é, correndo o risco de receber um carimbo de fanboy gigante na testa, digo que ainda não me decidi se os defeitos são de fato defeitos. Explico: o que mais senti falta nesse jogo foi a vasta gama de escolhas morais que cada quest apresentava. Os quests são mais lineares e as opções de moral duvidosa são geralmente objetivos opcionais. Suas escolhas não impactam tanto no desdobramento da historia quanto no New Vegas, por exemplo. Em compensação, a coesão dos quests com a narrativa principal é muito maior que nos jogos anteriores. Até agora, quase toda missão teve algum desdobramento no objetivo principal, e todas as facções são relevantes. Fiquei muito animado de perceber que são poucas as side quests puramente side, quase tudo importa. A narrativa é muito mais amarrada e interessante assim. Quanto mais liberdade narrativa é dada ao jogador, menos é disponível ao roteirista. Sendo assim, não estou tão pesaroso quanto imaginei que ficaria. Um excelente efeito colateral dessa maior amarração é a participação dos companions na construção da narrativa. Quem você escolhe como companhia para cada momento faz diferença.

Outro “defeito” que me deixou incerto de início foi a mecânica de diálogo. Há menos opções de resposta que os anteriores. Mas, novamente, aos poucos isso foi me conquistando. Nos anteriores era possível quase sempre voltar atrás e escolher novas opções. Mas como a flecha lançada e a oportunidade perdida, a palavra falada também não volta atrás. Isso gera uma maior tensão e menos controle sobre o resultado de cada interação, o que enriquece bastante a experiência. E é claro que você pode salvar antes de um diálogo e dar load se algo der errado, isso só nos impede de sermos amigos, mas somos todos livres.

Blade Runner e direitos civis, ou porque nada é clichê a toa.

Vamos a parte que me interessa de fato nesse, e em 90% dos jogos que eu gosto: a narrativa em si.

Assumo que quem chegou até aqui já viu, pelo menos, o trailer do jogo. Todos sabemos que o jogo começa durante a guerra fictícia entre China e EUA em 2077, que transforma os Estados Unidos no rico, e paupérrimo, universo da franquia. O/a protagonista está em casa, com seu bebe e seu marido/mulher. Bombas atômicas caem, o sonho acaba, todos correm pro bunker. Depois de 200 anos congelado, e de outras coisas, o protagonista acorda em um mundo insólito e muito diferente do seu. Assim começa sua missão para recuperar algo que lhe é muito precioso e que está nas mãos de gente que é tão poderosa quanto misteriosa. E assim acaba o que eu tenho para falar do protagonista. O que interessa mesmo nesse jogo, como em quase toda obra boa de ficção científica, são o universo retratado e as críticas feitas à sociedade atual.

O pano de fundo da narrativa desse jogo são os Synths, androides construidos por um instituto para servirem a um propósito, ora varrer, ora matar. Muitos deles, no entanto, possuem um “cérebro” tão avançado que têm sentimentos e desejos humanos. O mais humano deles, claro, é fugir da escravidão. O jogo aborda diversas facetas desses humanos heterodoxos. Desde uma questão simples da sua aceitação social por parte de uma sociedade que os generaliza, os teme e os odeia, até questões mais psicológicas e internas. Em duas ocasiões, me vi em diálogos com synths que não só defendiam seu lugar como humanos, mas também como mulheres. Impossível não fazer uma ponte com o debate de gêneros e direitos civis tão em voga hoje em dia.

fallout4 3Entretanto, nem todos parecem humanos…

Tudo isso é abordado com o humor que eu já estava acostumado das outras séries, personagens memoráveis e a hiperviolência caricata e genial da franquia.

Menções Honrosas

Dou um destaque especial a mais uma diferença entre este e os seus jogos precursores. Provavelmente por se tratar de um protagonista que é contemporâneo à guerra, muito da narrativa secundária do jogo é a respeito desta época. Nada incomum é hackear um computador e descobrir um diário de alguém com entradas de dias antes da catástrofe nuclear. Seja da produção de um filme, inadvertidamente reclamando de uma atriz que todos querem demitir ou de uma base militar onde já se antecipava de certa forma o que estava por vir.

Não posso terminar de escrever sem mencionar o colecionador de artigos de baseball e “especialista” no assunto. Ao chegar em Diamond City, encontre-o e faça a quest que ele abre. Demora dez minutos e vale muito a pena.

falloutbaseball
Saca tudo de baseball

Essas são minhas impressões iniciais. Não vou dar uma nota agora, pois ainda tem muito jogo pela frente e hoje em dia sou maduro e cínico, já tive meu coração partido muitas vezes.

Vá jogar Fallout!

Resenha: Broken Age

Broken Age“Like a Bucket of fingers”
“Like an alligator wrestling a pretzel”
“Like a mathematical formula”
“Like a lazy pole vaulter”


“Essa galera que fez The Cave não tem nenhum jogo novo, não?” Esta pergunta foi repetida algumas vezes em momentos de tédio eletrônico por minha ilustre namorada, a quem eu apresentei o videogame há seis anos atrás. Todas as vezes que esta dúvida surgia, procurávamos tanto no site da Double Fine quanto na PS Store. O trailer do Broken Age nos chamou atenção algumas vezes, mas, até pouco tempo, nenhum de nós tinha PS4. Recentemente este problema foi sanado do meu lado, e comprei o Broken Age.

Pra ver se valia a pena, comecei a jogar antes dela. Pouca coisa, só até zerar. Calma, não pense em mim como um viciado egoísta, houve uma boa razão: aguentar o jogo todo não é um trabalho para quem só joga há seis anos. É preciso maturidade e paciência para vencer certas partes desta saga. Vella e Shay precisavam da minha ajuda para vencer suas tribulações. Por muito pouco não os deixei na mão…

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“Por pouco não deixei os dois dormindo”

O jogo, ao mais famoso estilo Tim Schafer, é point and click. Logo no início notei algo muito promissor: o cursor alterna entre todos os objetos interativos do cenário quando se move o analógico direito. Fiquei feliz, pois de cara soube que não haveria aquele momento em que ficaria empacado varrendo cada pixel da tela para descobrir o que fazer, ao mais famoso estilo Tim Schafer. Os puzzles seriam um desafio mental, de pura lógica e método, causa e consequência. Não foi bem assim. Divido os puzzzles deste jogo em três grupos: os óbvios, os impossíveis, e o maldito puzzle do nó.

Muitos dos puzzles são tentativa e erro e/ou não fazem muito sentido. No lugar de um epifânico “Ah, então é assim!”, eu me peguei na maioria das vezes em um “Sério mesmo?”.

tube“Hmmmm, qual dessas seis possibilidades faz alguma coisa que eu não imagino? Vamos tentar todas…”

Em uma ocasião, é necessário esperar alguns minutos sem fazer nada para se obter um item. O puzzle final do jogo também não faz nenhum sentido, basicamente a solução é agir de forma burra. E o puzzle do nó… Ah, que fúria. Uma cólera digna de épicos gregos. Nele o jogador tem que, como já deve ter ficado implícito, desatar um nó cego. Sem muitos spoilers, é necessário achar um especialista em nós, DESCREVER o nó para ele e voltar com instruções passo a passo. A cada erro o nó muda, e é necessário repetir o processo. Ah, e não raramente ocorre um bug em que a opção certa não está disponível.

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“Nenhuma dessas, pra mim parece um game designer que não foi amado pela mãe”

Então caro leitor, você deve estar se perguntando por que eu, uma pessoa que não foi paga para escrever esta resenha, jogou Broken Age até o final? Muito simples: o roteiro do jogo é um dos melhores que eu vejo há um tempo. O tema central gira em torno de tradição e religião, e o porque de termos a tendência de não questionar a primeira e buscar a segunda. O jogo acompanha a vida de Vella e Shay, dois jovens com seus problemas. Vella está se preparando para ser oferecida como sacrifício a um monstro que visita sua vila a cada 14 anos. Perguntando a seus familiares por que não lutar contra ele, ela sempre ouve “Porque sempre fizemos as coisas assim”. Frase emblemática e verossímil, reforçada ao longo do jogo em várias situações. Já Shay vive em uma nave espacial sob os cuidados de uma mãe-computador superprotetora. Sua missão e destino são um mistério que seu tédio e sua curiosidade adolescente se põem a resolver.

hipster“Curtis já usava camisa xadrez muito antes de virar moda.”

Estes temas, embora sérios e relevantes, são abordados com um humor leve e que muitas vezes me fez rir alto sozinho em casa. O jogo tem personagens memoráveis e surpreendentemente complexos, com qualidades e defeitos. Desde o Guru com algo a esconder até seu súdito que leva a seita muito a sério, passando pelo lenhador com medo de árvores. Um destaque especial para as duas sacerdotisas cegas, cujo arco de narrativa é simplesmente perfeito.

Riddle“Repare na consternação de Vella ao perceber que estava frente a frente com personagens muito mais interessantes que ela.”

O jogo é dividido em dois atos, e me capturou de verdade no final do primeiro. Estava tão de saco cheio de seus puzzles que apelei para um walkthrough só para adiantar a história e chegar logo no final. Se você é como eu e valoriza uma boa história em um jogo, medite, tome um chá de camomila e encare Broken Age. Se paciência, ou masoquismo não são seu forte, pelo menos veja um walkthrough.

Nota: notaBA (2,5 / 5,0)